TSE forma maioria para tornar Bolsonaro inelegível por mentiras e ataques ao sistema eleitoral

 


Com voto decisivo da ministra Cármen Lúcia, tribunal caminha para determinar a inegilibidade do ex-presidente por oito anos. Dessa forma, político de extrema-direita só poderá voltar a disputar eleições a partir de 2030.

O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) formou maioria nesta sexta-feira (29/06) para tornar o ex-presidente Jair Bolsonaro inelegível. O voto decisivo foi proferido pela ministra Cármen Lúcia, que levou o placar para 4 a 1.

Com isso, na conclusão do julgamento, Bolsonaro deverá ficar inelegível pelo período de oito anos. O prazo começa a contar a partir das eleições de 2022, o que significa que o político de extrema-direita, que hoje tem 68 anos, só poderá voltar a disputar eleições a partir de 2030.

Os quatro ministros entenderam que o ex-presidente cometeu abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação em reunião com embaixadores estrangeiros, no Palácio da Alvorada, em 18 de julho de 2022. Na ocasião, Bolsonaro fez uma série de acusações mentirosas e sem provas contra o sistema eleitoral brasileiro.

Faltam votar outros dois integrantes do tribunal: Kassio Nunes Marques e Alexandre de Moraes. Além de Cármen Lúcia, votaram a favor da inelegibilidade os ministros Benedito Gonçalves, Floriano de Azevedo Marques e André Ramos Tavares. Até o momento, apenas o ministro Raul Araújo foi contra.

Em contraste, o TSE formou maioria para rejeitar a denúncia as acusações contra o candidato a vice da chapa de Bolsonaro, Walter Braga Netto.
Acusação e defesa

No primeiro dia de julgamento, na quinta-feira passada (22/06), o relator, ministro Benedito Gonçalves, apresentou um resumo da tramitação da ação no TSE. Ele afirmou que houve responsabilidade direta e pessoal de Bolsonaro ao praticar “conduta ilícita em benefício de sua candidatura à reeleição".

Em seguida, o PDT, partido que apresentou a ação, destacou que o caso não tinha como foco apenas uma reunião, "com evidente desvio de finalidade", de um presidente da República com embaixadores estrangeiros, mas ataques sistemáticos ao sistema eleitoral feitos por Bolsonaro.

O advogado de Bolsonaro, Tarcísio Vieira de Carvalho Neto, sustentou, em síntese, que não houve qualquer ataque antidemocrático ao sistema eleitoral na reunião com os embaixadores, que classificou como típico ato de governo, que "não pode ser enquadrado como abuso do poder político ou uso indevido dos meios de comunicação".

Em seguida, o Ministério Público Eleitoral deu parecer a favor da inelegibilidade de Bolsonaro.

Os votos dos ministros

Na terça-feira, na segunda sessão, o relator, ministro Benedito Gonçalves, votou pela inelegibilidadede Bolsonaro pelo período de oito anos. Num discurso com palavras fortes, Gonçalves considerou que Bolsonaro cometeu abuso de poder político e fez uso indevido dos meios de comunicação. O juiz isentou o general Walter Braga Netto, candidato a vice-presidente na chapa de Bolsonaro.

Segundo o ministro, Bolsonaro disse "mentiras atrozes" sobre o processo eleitoral brasileiro. "Não é possível fechar os olhos para os efeitos antidemocráticos de discursos violentos e de mentiras que colocam em xeque a credibilidade da Justiça Eleitoral", prosseguiu.

Reação de Bolsonaro

Na segunda-feira, Bolsonaro, durante uma reunião com deputados na Assembleia Legislativa de São Paulo, afirmou não ser justo dizer que ele atacou a democracia. "É justo cassar os direitos políticos de alguém que se reuniu com embaixadores? Não é justo falar em ataque à democracia", argumentou Bolsonaro.

Nesta quinta-feira, antes da retomada do julgamento, Bolsonaro voltou a afirmar que estava sendo vítima de uma injustiça. "É um absurdo o que estão fazendo. Estão procurando pelo em ovo. É uma injustiça comigo, meu Deus do céu."
A ação julgada pelo TSE

Bolsonaro foi acusado de cometer abuso de poder político e de usar indevidamente os meios de comunicação durante uma reunião que ele, então pré-candidato, organizou com embaixadores estrangeiros no Palácio da Alvorada, em 18 de julho de 2022, e na qual fez vários ataques infundados à confiabilidade do sistema eleitoral brasileiro, em especial às urnas eletrônicas.

Na reunião com os embaixadores, Bolsonaro fez uma série de acusações mentirosas e sem provas contra o sistema eleitoral brasileiro. Ele repetiu teorias fantasiosas sobre as urnas eletrônicas, atacou ministros do Poder Judiciário e declarou que o TSE deveria acatar "sugestões de transparência" feitas pelas Forças Armadas. O evento durou cerca de 50 minutos e foi transmitido ao vivo pela TV Brasil e em redes sociais.

Na época, o jornal The New York Times chegou a publicar que diplomatas ficaram abalados e incomodados com as falas de Bolsonaro.

Depois da reunião com os embaixadores, já em agosto de 2022, o PDT moveu uma "ação de investigação judicial eleitoral" contra Bolsonaro. O partido – que tinha Ciro Gomes como candidato à Presidência – afirmou que o então presidente praticou abuso de poder político.

Segundo o TSE, o abuso de poder político ocorre quando aquele que detém o poder se aproveita da sua posição "para agir de modo a influenciar o voto do eleitor".

O PDT argumentou ainda que Bolsonaro fez uso indevido do aparato estatal, já que a reunião ocorreu no Palácio da Alvorada e foi transmitida na íntegra pela TV Brasil, que é pública. A legislação brasileira proíbe candidatos que buscam a reeleição de usar a estrutura estatal e a máquina pública em seu proveito.

A ação também apontou para o uso indevido de meios de comunicação social, já que Bolsonaro usou suas redes sociais para divulgar os ataques ao sistema eleitoral. O PDT argumenta que o ex-presidente visava ganhos eleitorais com a publicação das imagens, até porque ele parecia ter o apoio dos países representados na reunião.

Ou seja, o encontro com embaixadores em Brasília foi uma das peças de campanha eleitoral que compuseram a narrativa criada por Bolsonaro de que as urnas eletrônicas podiam ser fraudadas.

A investigação coletou depoimentos e provas. O vídeo da reunião com os embaixadores é, com certeza, a principal delas. Ele foi entregue pelo próprio PDT quando moveu a ação.

Outra prova incluída no processo foi a chamada "minuta do golpe", apreendida pela Polícia Federal. O documento é o rascunho de um decreto presidencial com o qual Bolsonaro instauraria Estado de Defesa e realizaria uma intervenção na sede do TSE em caso de derrota nas eleições. Ele foi encontrado na casa de Anderson Torres, que foi ministro da Justiça e Segurança Pública de Bolsonaro.

Essa minuta pode reforçar o entendimento de que ameaças golpistas eram recorrentes no governo passado – e inclusive envolviam outros órgãos de Estado.


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